quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

One Love


Músicos do mundo inteiro se juntam e fazem sua parte para mudar o mundo. Emprestam suas culturas, seus belos sotaques, suas roupas coloridas, seus cabelos sensacionais. São únicos e fazem muito com o que têm de melhor: sua música.

Ano passado, conheci o projeto Playing for Change - Song Around the World, com Stand by Me. Foi meu cartão de Natal e Ano Novo.
Para este ano, escolhi One Love, que é esperança, que é “um só amor”. Um canto de paz.

Que em 2010 a gente possa estar perto de nossos verdadeiros e fortes amigos. Que sejamos, também, fortes e verdadeiros sempre.
E que, em cada esquina do mundo, haja alguém renovando a esperança de que tudo vai dar certo.

Let's get together and feel all right.


One Love: http://migre.me/fhQ4

domingo, 8 de novembro de 2009

Hoje eu canto só você, Lenine.


Hoje, acordei cedo e fui direto para a Blip. Pra quem não conhece, a Blip é uma dessas rádios onde se compartilha sessões de músicas e vídeos com ouvintes do mundo inteiro. Lá, se acha de tudo. As pessoas vão se tornando ouvintes das outras por afinidade musical. E, além de se conhecer muita coisa nova e velha, sempre há alguém que “blipa” uma música que você gosta muito, e que não se lembrava mais. Ou uma versão diferente de uma música que você já conhece.

Então, entrei na Blip e encontrei uma música do Lenine, Todas elas juntas num só ser.
Conheci da primeira vez que fui a um show dele. O som estava péssimo, o lugar era horrível. Era uma daquelas calouradas mal organizadas (o que chega a ser redundância). E, ainda assim, o show foi sensacional. Nesse dia, fiz minha última tietagem. Quis chegar perto do Lenine, e consegui. Disse a ele algo do tipo: “só estou aqui porque fiquei muito emocionada com o show, e não resisti”. Ele, do alto de sua elegância e generosidade, apertou minha mão e não soltou mais. Enquanto ele conversava com as outras pessoas, encostava minha mão em seu rosto. Depois, deu um beijo nela e soltou. E eu fui embora feliz.

Lenine faz tudo ficar lindo. Esta música, parceria dele com Carlos Rennó, é uma homenagem à sua esposa, Ana. Foi feita sob uma forma antiga, batida, que tem tudo pra deixar qualquer música óbvia e massante. São sete estrofes imensas, em que ele cita as musas famosas de vários compositores. Da Pastorinha de Noel Rosa à popozuda do Bonde do Tigrão, passando por Luiz Gonzaga, Edu Lobo, Chico Buarque e Fausto Fawcett. E ainda sobra tempo para Funny Valentine, de Lorenz Hart, Madeleine, de Jacques Brel, e Roxane, do Sting.

Apesar de ser perigoso, esse tipo de composição causa uma identificação imediata nas pessoas. Elas se sentem agraciadas pelas referências que conhecem. E, com o Lenine, isso não soa pedante, como observo em compositores que adoram encher suas letras de “erudição”. Zeca Baleiro é um que sabe fazer isso bem mal.

No show de lançamento do seu último álbum, Labiata, aqui em BH, Lenine cantou Feira Moderna lindamente. E a mineirada (que adora enxovalhar o Clube da Esquina) se sentiu homenageada e vibrou com a lembrança carinhosa. Foi bonito mesmo. Gosto de ter por perto gente assim como o Lenine: "fina, elegante e sincera", citando o Nelson Mota, outro cara pra lá de elegante. E, nesse quesito, a vida tem sido muito bacana comigo.
Lenine é um príncipe. E é único na forma de compor, de tocar, de cantar, de se vestir e se portar. “Que nem você, não há ninguém nem quê.

Nos comentários tem o vídeo de Todas elas juntas num só ser.



terça-feira, 6 de outubro de 2009

Não dá mais pra voltar porque eu fiquei tão longe.


Andei um pouco recolhida. E isso resultou, também, em minha ausência por mais de dois meses aqui no Miçangas. Durante este tempo, fiquei vários dias sem beber, parei de fumar (estou lutando com todas as minhas forças), lidei com problemas de saúde na família, decidi fazer uma cirurgia, reencontrei amigos queridos, descobri que não tenho tantos amigos assim, revisitei meu passado de maneiras diferentes e espero, realmente, estar iniciando uma fase nova. Durante muitos meses, tive a sensação de não dar um passo à frente. Falei muito sobre o que já foi e a nostalgia foi uma grande amiga. “Nostalgia” era o nome do primeiro disco que minha mãe comprou pra tocar em nossa nova vitrola. Veio junto com um do “Baianos e os Novos Caetanos”. Um dia perguntei a ela “quem era o Nostalgia.” Ela tentou me explicar o que significava o termo, mas acho que não entendi absolutamente nada. O disco, se não me engano, tinha bolero, foxtrot, tcha-rcha-tcha, coisas que nos anos 70 estavam em desuso.

Dia desses, caiu em minha mão um livro muito bonito. Chama-se “O Mundo Acabou!”, de Alberto Villas. É um livro de memórias, de costumes da classe média da época da infância do autor, anos 50. O livro nos lembra e/ou nos apresenta coisas que estão presentes na memória do brasileiro: drops Dulcora, brinquedos Estrela, anúncios antigos da Coca-Cola, do creme dental Kollynos. É delicioso. Voltar ao passado para resgatar memória afetiva é sempre bom. E a música promove isso a toda hora.

Meados dos anos 80, eu devia ter uns 13 anos e estava assistindo ao antigo programa do Faustão, o “Perdidos na Noite”. Nesse dia, Cazuza e Paulo Ricardo foram convidados para uma sabatina musical. Uma espécie de “Qual é a Música”, com muito mais conteúdo. Soltaram perguntas sobre a obra de Cartola, de Nelson Cavaquinho, de Dorival Caymmi. Me impressionou como o Cazuza desbancou o Paulo Ricardo no jogo. E entendi, na hora, porque o trabalho dos dois é tão diferente. Cazuza tinha grandes referências.

Estou ouvindo bastante os CDs novos do Arnaldo Antunes, “Iêiêiê”, e do Otto, “Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos”. Os dois me foram apresentados por um amigo que dividiu 15 dias de trabalho comigo, recentemente. E, por sinal, fizemos juntos uma bela campanha “anos 50”. Os CDs são exemplos do que representam as boas referências. Arnaldo Antunes e Otto são compositores que se renovam em cada trabalho. E mostram bem o quanto é importante para um artista reconhecer suas raízes. Tocar as pessoas com sua arte passa sempre por resgatar, com inteligência, a sua memória afetiva. E música boa se faz assim.

Por falar em nostalgia e música boa, segue aí uma do Nelson Cavaquinho, por Arnaldo Antunes, do álbum “O Silêncio”. Junto aos comentários (que eu espero que vocês façam) tem um clip de "Longe", do CD novo dele, o “Iêiêiê”.

Ah, fiquei feliz com os novos seguidores. Muito bem-vindos.

domingo, 26 de julho de 2009

É um barato a discoteca do Chacrinha.


Entre o final dos anos 70 e início dos 80, o programa do Chacrinha me apresentou Sidney Magal, Odair José, Fernando Mendes. Fábio Júnior, Dalto, Marcos Sabino, Ritchie. E eu era fã principalmente do Magal e do Ritchie. A patrulha ideológica começava em casa: mãe, irmãos e até minha avó, que gosta daquela aberração do Agnaldo Timóteo, censuravam. Acho que eles tinham medo de que eu me tornasse uma daquelas "macacas de auditório" que iam chorar na platéia do Chacrinha. Aquilo era um horror mesmo. Eu achava muito engraçado. Com os amigos, eu curtia o pop rock que surgia nos anos 80. Dividir a trdicional MPB com a pirralhada já era difícil. Assumir pros amigos que eu gostava de samba, que a família inteira curtia, era mais difícil ainda. Imagina música brega? Mas até hoje observo, nos bons finais de festa, que as pessoas conhecem o repertório cafona brasileiro e gostam. Fecham os olhos pra cantar, fazem gestos caricatos, brincam, pra não assumir, mas gostam.

E, felizmente, hoje tenho alguns amigos que curtem de verdade. Tem gente que acha que é modismo, zoação, mas não é. Outro dia, senti que o pai de um colega, que deve ter seus 55 anos, ficou decepcionadíssimo comigo porque eu falei que curtia Odair José. Por mais refinadas que sejam as referências musicais do indivíduo, todo mundo tem uma identificação com os traços dessa música exageradamente sentimental. Está no sangue latino, mas está no saxão e até no nipônico. Já ouviram as músicas japonesas da trilha de Kill Bill? Parece que saíram do México, do Uruguai.

Odair José é um dos meus preferidos. Sua música é simplória e inteligente. Muita gente acha banal, mas ninguém de sua época falou tanto das minorias com tanta clareza e sinceridade. E quem vendia, mesmo, nos anos 70, eram artistas como ele. Chico Buarque e Caetano Veloso, que por sinal apoia esse tipo de música desde a Tropicália, eram considerados cult. E vendiam apenas para o público mais engajado, segundo Paulo César Araújo, autor do Livro Eu não Sou Cachorro Não – Música Popular Cafona e Ditadura Militar. Outro emblemático: Waldick Soriano. Minha mãe adora Torturas de Amor. Mas eu me lembro dela falando assim: “Essa música é muito bonita. Será que é dele mesmo?” Olha que absurdo!

Magal foi criado por Paulo Coelho, quando este era produtor. Em Arrombou a Festa, do Paulo Coelho e da Rita Lee, ele mesmo arrasa sua criatura: “Cigano de araque fabricado até o pescoço.” É verdade. Mesmo assim, acho o Magal um artista fabuloso. Canta bem pra caramba, tem um swing impressionante e um excelente domínio de palco. Adoraria ser backing vocal dele.

Paulo Sérgio, como Odair José, alavancou sua carreira imitando Roberto Carlos. O trabalho dele não tem um décimo da qualidade do que o Roberto fazia na época. Os arranjos são precários, com teclado tosco imitando cordas. E o contrabaixo é sempre desafinado. Mas o cara era carismático e tinha uma musicalidade incrível. Era depressivo e foi um grande incentivador dos cortapulsos. Um dia, uma manicure me emprestou um cd dele. Levei para ouvir no trabalho, à tarde. Uma colega me pediu: "por favor, tire esse CD porque eu estou ficando deprimida, com vontade de morrer". Ele tinha esse poder. O sucesso do Paulo Sérgio incomodou o Rei. O nome do álbum O Inimitável, de 1968, é uma referência à sua imitação descarada. Perla também é bacana, apesar de só ter gravado versões, inclusive dos suecos do ABBA, que também são cafonas demais. Ah, e gosto de uma música com a Kátia Cega. Maldade, mas já virou sobrenome mesmo. Ela canta muito mal, mas a interpretação de Lembranças, de Roberto e Erasmo, é bem legal.

Que fique bem claro: gosto de música brega autêntica, por mais complexo que isso seja, e com personalidade. Isso não tem nada a ver com pagode ruim, breganejo e afins.

Tenho muita vontade de cantar as músicas desses artistas. Ainda não encontrei quem animasse fazer um trabalho assim comigo. Mas não desisti. E vou fazer com o maior carinho e respeito. São músicas que falam bem dentro de mim de muita gente, eu sei.
Então, com vocês, o cigano de araque e sua cigana Sandra Rosa Madalena. "Cantem!" "Comigo!"

domingo, 5 de julho de 2009

Hoy en mi ventana




Hoje, descobri uma cena de um filme que ainda não vi. Cria Cuervos, do espanhol Carlos Saura. Conta a história de três crianças que ficam sob a guarda da tia depois de perder os pais de maneira estúpida. Vi só uma cena e fiquei muito emocionada. É linda. As crianças dançam Por Que Te Vas. Devia ter a mesma idade da menininha de vermelho quando essa música chegou pra mim. A Lílian cantava a versão, Eu Sem Você. Meu irmão tinha o compacto. Do outro lado, tinha Eu sou Rebelde, que também é versão. Ouvia Eu Sem Você sem parar. Cantava, dançava, imitava a Lílian. Adorava os naipes de metal do arranjo, idêntico ao original.
Em 2003, fazia uma oficina de teatro. E a professora me pediu que levasse uma música pra cantar na montagem de um texto do Murilo Rubião, O Convidado. Pensei durante uma semana sobre o que poderia escolher. Tinha de se encaixar com a cena de uma barca que vai embora. O texto é puro realismo fantástico. A história não é datada, não se passa em nenhum lugar específico. E o final é uma incógnita. Só conseguia pensar em Eu Sem você. Um colega sugeriu que eu a cantasse em espanhol. Adorei a experiência e a música passou a ser mais importante ainda pra mim. Senti que consegui realizar um desejo de criança. E vendo a história triste do filme, hoje me lembrei da minha infância. Muito mais alegre. Cercada de amor e cuidado. Eu só conhecia a tristeza das músicas e dos filmes. Mas, de alguma forma, ela já me tocava. Parecia dizer: "uma hora eu vou te visitar". Visitou e foi embora várias vezes. De vez em quando, volta. Mas não agora. Hoy en mi ventana brilla el sol. Não tem muito lugar pra ela aqui. Mas que é bonita, é.

Em "comentários" tem o link da cena. Abaixo, Por Que Te Vas, com a Jeanette.

sábado, 13 de junho de 2009

Me dê a mão, vamos sair pra ver o sol.

Tatiana Tameirão - Ver Art da Tati


Espero um vento forte que me leve a outro rumo quando o mundo pegar o sul.
Levo as músicas que me traz e as que eu te dou.
À tarde, quero sentir sua falta, sabendo da sua vinda.
Te espero pra te aquecer neste primeiro inverno. E pra ganhar seus pés.
Te levo pra uma casa branca, em uma estrada que leva sempre à verdade.
Lá, a gente corre e olha o céu azul e o sol, que não para de brilhar.
Lá, a gente ouve Cartola e fala de Roberto Carlos.
Levo seus pequenos olhos. Nada pálidos, nada azuis. Tão imensos.
Como a Dolores, que fazia tudo “até morrer”, lá eu morro de tudo o que eu quiser.
"Sem pensar no que foi que sonhei, que chorei, que sofri".
Sem pensar se o que eu deixei pra trás não foi pouco.
O que eu tenho é sempre muito.
Quero o transitivo e o intransitivo do verbo.
Pra te querer muito mais.


De Dolores Duran e Tom Jobim.

domingo, 24 de maio de 2009

Vida veio e me levou.



Hoje, durante a sessão de Budapeste, fui acometida por um ataque de ansiedade. O filme, como livro que nem terminei de ler, não me pegou mesmo. Então, desci a rua pra pegar o ônibus. Com fome, um leve mau-humor de tpm e muita vontade de escrever. Não seria sobre o filme nem sobre o Chico. Não seria especificamente sobre uma única coisa. E, sim, exatamente como tem sido. Para escrever aqui, costumo seguir um entre dois caminhos. No primeiro, reflito um pouco sobre alguma ideia, um problema ou uma pendência que me ronda E, fatalmente, isso me traz uma música. Já falei sobre isso no início do blog. No segundo, a música me convida a escrever sobre ela, seu autor ou intérprete. Hoje, fico com o primeiro caminho. Já comi alguns pedaços de frango assado e confesso que meu mau-humor foi amenizado por um doce telefonema. Mas quero falar sobre o ocorrido antes que o incômodo passe.

Cheguei ao ponto de ônibus e comecei a conferir as linhas que passavam por lá. Fiquei atenta pra não trombar em uma moça de cabeleira loura e longa (até a bunda) que carregava um bebê. Mas não era um bebê. Era um cachorrinho. E a moça devia ter uns 68 anos. Mas ela não se lembra disso mais. Ninava o cachorro com uma voz insuportavelmente fina. Parecia a cuca. A primeira, que a Dorinha Duval fazia. Falava sem parar, fazia beicinho e rodava a saia de seu minivestido lilás enquanto esfregava o rosto no cachorro. A filha estava perto tentando conversar com outra mulher. Mas os grunhidos da mãe não deixavam.

Dez minutos. Vinte minutos e nada do ônibus chegar. Descobri que a verdadeira voz da "moça" é fina só pra falar com o cachorro. Quando engrossava, falava mal e sem piedade de uma mulher que lhe pediu 1000 reais emprestados. Dizia assim, bem malvada:

- Se ela tivesse me pedido 100 reais, eu emprestaria. Mas ela tem o “olho grande” e me pediu 1000. Ah, não emprestaria nem se tivesse.

Enquanto isso, a filha tentava ignorar a presença da mãe. Às vezes, pedia com educação, mas irritada, que ela parasse de falar um pouco. E a cuca continuava babando no cachorrinho. Tive pena dele. Deu vontade de arrancá-lo do colo dela. Pensamento quase tão idota quanto a conversa da mulher. Eu sei.

Comecei a pensar sobre o dito vulgar que diz “toda mulher é igual”. Nem toda mulher, nem todo homem, nem todo ser humano. Em algum ponto a gente se encontra, é claro. Ainda que seja no ponto de ônibus. Mas, igual a gente não é. Por favor!
Pensei também sobre a velhice, que me assusta especialmente pelas perdas que traz. Tenho medo de perder os dentes, os cabelos, o viço da pele, a visão, a memória e até (principalmente) o senso de ridículo. O medo é diferente em cada um. Porém, atire a primeira pedra quem não tem medo de envelhecer. Nessa dor, com mais ou menos elegância, a gente sempre se encontra. "Que dia, nossa!"




quarta-feira, 20 de maio de 2009

Pensando em ti, Nelson Gonçalves.


Nelson Gonçalves apareceu para o grande público quase no final da Era do Rádio. Orlando Silva era sucesso absoluto. Então, no início, Nelson buscou reconhecimento e sobrevivência imitando o "Rei das Multidões". Mas logo foi tratando de colocar sua personalidade muito peculiar pra fora. No auge de sua carreira, a melancolia do pós-guerra reafirmava a música romântica e de fossa. Interpretações pesadas e cheias de lirismo estavam em alta, o que só favoerceu seu sucesso.
Nelson sobreviveu ao vício, à prisão, aos relacionamentos amorosos conturbados e à sua enorme prepotência e falta de educação. Conseguiu manter a carreira ativa, de 1941 a 1998, com pequenos hiatos entre uma gravação e outra. Sobreviveu a todas as correntes e movimentos culturais que atravessaram este período, sem perder a majestade.

Quando eu conheci Nelson Gonçalves, detestei. A voz dele me arrepiava. Hoje, não só consigo reconhecer o grande intérprete, como sua voz grandiosa. Seu repertório sempre me chamou a atenção. Cantava os melhores compositores brasileiros, de Adelino Moreira e Herivelto Martins a Herbert Vianna e Lobão. Com um jeito só dele e com arranjos definitivos. É meio engraçado ouvir o Nelson cantando “Me chama, me chama, me chama”. Mas tudo o que ele fez na música merece minha reverência. No repertório, uma infinidade de temas sentimentais, passionais e de exaltação à mulher. Acho que por tudo isso, e por seu talento assombroso, sempre esteve presente no gosto popular de várias gerações. É e será por muito tempo uma figura forte, daquelas que recebem os créditos das músicas que interpretam: “música do Nelson Gonçalves, da Elis Regina, da Ângela Maria”. Não é assim que se diz?

Segue esta do Herivelto Martins e do Davi Nasser, gravada há 52 anos por ele, Nelson Gonçalves.



quinta-feira, 23 de abril de 2009

E nem mesmo um pensamento eles possam ter para me fazerem mal.


Ainda bem novinha, comecei a ir às festas de São Cosme e Damião no centro de Umbanda que minha avó freqüentava. Adorava as músicas, o batuque, os rituais. É tudo muito bonito. Quando ela percebeu meu interesse, começou a me falar sobre os orixás. Fazia uma confusão danada na minha cabeça, dando respostas incompletas. Mas conseguiu despertar minha simpatia por eles. Uma das primeiras coisas que aprendi (e já esqueci) foi a fazer a correspondência entre todos os orixás e os santos da igreja católica. Isso vem de um recurso usado pelos escravos para preservar o direito ao culto de suas religiões.

Meu orixá, de acordo com os ensinamentos de D. Zenília, é Xangô. Ele é um guerreiro atrevido, daqueles que não costumam levar desaforo pra casa. Porém, justo. São João Batista é um dos santos que correspondem a esse orixá. Até hoje minha avó me chama de São João do Carneirinho. Por causa do cabelo curtinho e anelado. Nem preciso dizer que adoro isso.

Mas desde que descobri São Jorge, passei a gostar dele também. São Jorge era um militar da Capadócia, terra que hoje pertence à Turquia. Morreu degolado em nome de sua fé em Jesus Cristo. E, segundo a Umbanda, Oxossi é o orixá que mais se assemelha a ele.

De São Jorge, gosto da história. Gosto muito da oração, que nos orienta a preservar os inimigos, mas mantendo todos bem longe da gente. E gosto muito da figura. Há uns 4 ou 5 anos, ganhei um calendário de São Jorge. Desde então, levo em minha carteira, tampando a cédula de identidade. Tem me protegido.

Hoje é o dia dele. “Eu estou feliz porque também sou da sua companhia”.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Eu, muito sério, vou remando.



Queria falar de coisas mais leves, mas não estou muito leve. Queria falar mais de música. Queria falar das pessoas e de tudo o que mais amo na vida. Não consigo agora.

Não sei se é adequado citar Manoel de Barros sem leveza. Mas ele sempre me faz bem. Um de seus poemas fala de sua decepção quando, na infância, descobriu que a cobra de vidro, perto de sua casa, tinha outro nome: “enseada” - muito sem poesia, segundo ele. Há uma enseada ao meu redor. Mas nada tão triste que me impeça de estar bem ao fim do dia. Meus dias têm terminado bem. Todos têm sido de busca, de tentativa, em todos os sentidos. E tenho, sim, recebido e percebido muito em troca. Mas estou cansada, e fui obrigada a colocar alguns planos e algumas relações de molho. Especialmente as que não estão leves.

Quem é bem-vindo perto de mim sabe que é muito bem-vindo. Sempre sabe. Mas, às vezes, fico querendo entender qual a minha missão com determinados seres, saber o que eles querem de mim, ou o que eu quero deles. E não consigo entender nada. Deve ser para exercício da paciência. Aprimoramento espiritual. Queria tirar férias de algumas pessoas. Umas, só por uns dias. Outras, por uns meses. A outras, queria dizer: “Vá viver sua vida e não me siga”. Aliás, “Já Passou” é uma ótima música pra cantar pra elas. Tanta coisa em minha vida já passou, já foi... E tanta coisa já chegou... “Acredito que estou vendo uma luz do outro lado do rio”. E não vou esperar essa luz ir embora. O resto, já passou.



segunda-feira, 2 de março de 2009

Pela curiosidade de ver onde o sol se esconde.


Uma amiga poeta escreveu outro dia: “Amores possíveis não dão bons filmes, meu bem”. Trocadilhos à parte, eu tenho que concordar que o filme não é bom. É baseado naquela fórmula de Corra, Lola. Corra, que sugere como teria sido sua vida a partir de cada escolha que você pudesse ter feito. Mas não é por isso que o filme não é bom. O tema está saturado no cinema mas é bacana. Faz pensar.

Uma vez fiz uma escolha que percebi, no ato, ter mudado o rumo da minha história. Pedi à minha mãe pra sair de uma escola boa e ir pra uma ruim. Tinha um motivo fútil, que não convenceu, e um precipitado: queria resolver minha vida profissional. Achava que era simples assim. Então, fiz o segundo grau em uma escola técnica, dessas que acabaram com o ensino no Brasil. Segui apenas por dois anos a tal profissão e, quando me vi infeliz, tratei de buscar o caminho que já havia me seduzido. Vestibular, faculdade, estágios. E hoje eu sou publicitária. Desempregada no momento, é verdade. Mas não infeliz. O primeiro caminho, que eu felizmente abandonei, serviu apenas para colocar pessoas em minha jornada. Nessa escola ruim, fiz um amigo e uma amiga. O amigo foi-se embora pra Belém. Através dessa amiga, que também se foi, conheci um cara que me fez sair dos trilhos. A amiga ainda me trouxe uma analista que me ajudou a voltar pros trilhos.

Essa escola serviu também para me indicar a uma empresa. Lá, tive um chefe que me ajudou a ingressar em minha segunda profissão. Foi lá que conheci mais duas de minhas melhores amigas. E comecei um namoro que iria acabar em casamento, mas acabou porque eu queria mais da vida.

Algum tempo depois, trabalhei em uma agência que parecia um hospício. Com uma dona que parecia dona de qualquer coisa, menos de agência de publicidade. Um dos doidos de lá era fã de música boa, muito engraçado e muito gente fina. Por causa dele, conheci pessoas que se tornaram importantes na minha vida.

Como teria sido se tivesse escolhido outro caminho aqui e ali? Vai saber. De uma coisa eu sei: a medida do possível é sempre muito pouco pra mim. Já tentei entender o porquê, mas desisti. Acho que não tem nada pra Freud explicar. Nunca encontrei laranja madura na beira da estrada. E sou alérgica a picada de marimbondo. Corra, Elena. Corra. Escreva, Elena. Escreva. Escolha, Elena. Escolha. E veja bem o que merece consideração.



segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O samba é a corda e eu sou a caçamba.



Ganhei uma coletânea de 24 sambas dos anos 70 e 80. Tem Roberto Ribeiro, Agepê, Benito di Paula, Alcione, Gilson de Souza, Originais do Samba, Martinho da Vila. Todos eram considerados bregas. Alguns são até hoje. Pura injustiça com esses sambistas de verdade. Nessa fase, também tinha um bom espaço para os que sempre foram “cult”: Gonzaguinha, Chico Buarque, João Bosco. Eram deles os sambas aceitos pela patrulha ideológica da época. Em nenhuma das duas listas o Paulinho da Viola se inclui. Ele está no cordão das unanimidades, junto com o Cartola.

O que acho interessante é que justamente nos anos 70 e 80, quando o ritmo foi tão marginalizado, é que surgiram alguns dos melhores sambas, depois da Época de Ouro, é claro. Acabei de falar sobre o CD pra um amigo quase da minha idade. Ele ficou animado e entendeu perfeitamente quando eu disse: “aquelas músicas que as nossas mães ouviam quando a gente era menino.”

Instintivamente, sempre ouvi música separando os instrumentos. E gosto de perceber os sons mais graves primeiro. No samba, o violão de 7 cordas pula na frente. O que é o que é e Com a perna no mundo, do Gonzaguinha, são exemplos de bons arranjos com esse instrumento de eminência parda. As músicas que a Alcione gravou antes da fase Carlos Colla, Sullivan e Massadas, em que o sax e a tecladeira predominam, também têm "7 cordas" memoráveis. O Cartola não abria mão do Dino, que faleceu há pouco tempo, e até hoje é a maior referência desse instrumento no Brasil. Tentei saber quem são os músicos que tocavam em alguns dos sambas da coletânea. Procurei as fichas técnicas na Internet e não encontrei nem nos sites oficiais dos artistas. Nos álbuns antigos, relançados em CD, também não costumam colocar esses créditos. É o fim. E vou ter que buscar os LPs antigos, se quiser saber.

Não achei o que procurava, mas ouvi duas coisas muito legais. Primeiro, foi a música Mangueira é Mãe, do cd novo da Alcione, ainda em fase de produção. Uma grata surpresa. A música é do Falcão e do Serginho Meriti. Falcão canta com Alcione. Arranjo perfeito, com naipes de metais e uma percussão pra ficar de boca aberta. Nesse mesmo álbum, o Gil divide com ela Entre a sola e o salto. Uma bela música dele, gravada há muitos anos pela marrom. E encontrei no site do Gonzaguinha algumas gravações de suas fitas demo. Um material bacana pra quem gosta mais de velharia do que traça.

Abaixo, os links dos sites da Alcione e do Gonzaguinha. E, só pra variar, uma autêntica cortapulsos. Uma homenagem ao samba, conduzida por um belo "7 cordas", com um back bem ao estilo das cabrochas.

alcioneamarrom.com.br
gonzaguinha.com.br


quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Baixa santo ou orixá, lá lá lá.



De onde vem o lá lá lá? Pode ser lá rai á ou lá rá rá. Eu não sei, mas alguém deve saber de onde vem. O Tinhorão deve explicar isso muito bem. Vou procurar. O lá lá lá costuma imprimir uma marca muito forte nas músicas. E resolver alguns problemas de expressão também. Há quem diga que é onomatopeia ou interjeição. Eu não sei também. Está nas óperas italianas e, consequentemente, em muita música ocidental. Passeia por nove entre dez sambas famosos.

Laia ladaia sabanada ave maria: outra (não sei o quê) do mesmo tipo que se aplica em muita música. Dá um ótimo improviso numa roda de violão. Aliás, essa pulou daqui até o Carlos Santana. Ou será que desceu do México pra cá antes do Santana se apropriar? Está também em You don’t know me, do Transa. O que dizem é que Santana copiou o "laia ladaia" da música Reza, de Edu Lobo e Ruy Guerra, para o solo de Oye como va. E eles copiaram de quem? Certamente da cultura popular. Não importa de onde. Não tem dono. Assim como não tem mãe o infeliz que resolveu colocar lá rá iá no final de todos os pagodes vagabundos.

Mas o famigerado lá lá lá também pode ser usado para o bem e com muita propriedade. Quando a música é boa e se sustenta sem ele, é claro. Um exemplo bacana é Extra, do Gil. Aliás, que música sensacional. E que lá lá lá fantástico! É tão legal quanto ouvir a mãe do meu amigo dizer "ô lê lê". Só pra falar que está feliz com sua chegada. Ou minha amiga "a louca" resumir a conversa com um lá lá lá. Assim a gente se expressa. Na maioria das vezes, com alegria.

Lá iá lá iá lá iá lá iá!
Lá iá lá iá lá iá lá iá!


segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Um ardoroso espectador vira colibri.


Estava olhando a chuva cair lá fora e ouvindo “O Circo Místico”. Fiquei pensando na delicadeza dessa música. Como pode ser assim? Foi composta para “O Grande Circo Místico”, do Ballet Guaíra. O espetáculo é baseado no poema de mesmo nome, de Jorge de Lima, que assim começa:
“O médico de câmara da Imperatriz Tereza - Frederico Knieps - resolveu que seu filho também fosse médico. Mas o rapaz, fazendo relações com a equilibrista Agnes, com ela se casou, fundando a dinastia de circo Knieps de que tanto tem se ocupado a imprensa.(...)"
O poema, por sua vez, é inspirado num fato real. No Circo, a vida real se mistura a outra realidade. E a trajetória do artista se mistura à nossa. “O grito do homem voador ao cair em si”... como é bonito isso... Como pode ser assim?

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Dor no apogeu.


“Ai de mim!”. “Ah, quanta desventura!”. A música de fossa me arrebata. Já falei sobre isso por aqui. Dor pra nenhuma Antígona botar defeito.

Segundo Jairo Severiano e Zuza Homem de Melo (leitura básica pra quem quer saber sobre a nossa música), o período áureo do samba-canção-depressivo ou samba-de-fossa é de 1952 a 1957. Lúcio Alves, Nelson Gonçalves, Dalva de Oliveira, Dick Farney e Ângela Maria cumpriam seu estrelato. As primeiras músicas do Tom ganhavam as rádios. Maysa lançava “Ouça”, hino maior da dor-de-cotovelo. E Fernando Lobo deixava uma grande herança pro seu filho, Edu, que mais tarde começaria a compor a dor da forma mais sublime.

Estava assistindo à minissérie Maysa um dia desses e, nela, o Bôscoli diz que “samba-canção é que anda pra trás”. Era um bobo mesmo, coitado. Bobo pra ser bem leve nos meus xingamentos. Ele nem imaginava que gente da sua própria geração e das seguintes fariam história compondo e cantando a dor em samba-canção. Enquanto isso, o “barquinho” dele e do Menescal continua me dando enjôo.

Está aí uma relativamente nova "corta-pulsos". Da doce Teresa Cristina e do Pedro Amorim, por Roberta Sá e Ney Matogrosso.




sábado, 3 de janeiro de 2009

Vamos começar lavando os pratos.


Em 2005 ganhei de uma amiga um monte de músicas muito especiais gravadas num CD. Cuidado e carinho na intenção, na seleção, na capinha, na forma de entregar o presente (esse veio com flores). As pessoas mais queridas sempre me deram música. De uma forma ou de outra. Hoje peguei esse presente pra ouvir e uma música de O Som do Sim, do Herbert Vianna, me tirou da melancolia: Vamos Viver. Repeti, repeti, repeti e me prendi à alegria que ela tem na letra, na veia do compositor, na voz infinita da Sandra de Sá. Veio como alento pros meus receios, pra minha ansiedade, e me ajudou a preparar o espírito pro ano que chegou. O meu 2009 começa como uma nova etapa, e não só como um marco simbólico. Às vezes a vida muda junto com o ano. Às vezes muda até com a lua.

“Vamos viver só de amor” não tem nada de utopia. É um convite a buscar um sentido novo em tudo. A vida, o trabalho, o supermercado, os pratos na pia, os discos na prateleira, o aluguel, a dor, a chuva, tudo isso tem outra cor quando a gente se prende ao que realmente interessa. Ao que é essencial: ter com quem contar pra poder falar dos próprios medos e assim eliminar pelo menos mais um. Sentir que você é muito importante pra muitas pessoas. Sorrir de alegria sem saber exatamente o motivo. Ganhar de presente a música e guardá-la pra sempre. Sobre todas as coisas, sob todas as formas, sempre há um motivo "pra se viver do amor".